Lavanderia Esportiva

As camadas por trás dos campeonatos esportivos


O esporte há muito deixou de ser apenas uma forma de entretenimento ou competição. Ele se tornou uma linguagem universal, capaz de conectar pessoas de diferentes culturas e classes sociais. Mais do que isso, o esporte influencia esferas econômicas e culturais de forma profunda.

Em 2023, as principais 14 ligas esportivas ao redor do mundo movimentaram impressionantes US$ 80,6 bilhões, segundo dados da SportsValue, superando os US$ 66,2 bilhões registrados em 2019, antes da pandemia. Ao incluir eventos como as Olimpíadas e a Copa do Mundo, esse montante chega a US$ 97,6 bilhões. Esses números evidenciam que o esporte transcende seu papel de lazer, mas o que realmente está por trás desse fenômeno?

Uma prática conhecida como "sportswashing" tem ganhado cada vez mais notoriedade ao misturar esporte e política. O termo, que une as palavras "esportes" (sports) e "lavagem" (washing), se refere ao uso do esporte por governos – sejam ditatoriais ou democráticos – para melhorar suas imagens ou desviar a atenção de crises internas, como corrupção, violações de direitos humanos e ataques à democracia.

Essa estratégia é uma forma de "soft power", ou poder brando, conceito introduzido pelo cientista político americano Joseph Nye. O soft power envolve a utilização de influências sutis para influenciar outros países por meio de atração e persuasão, ao invés de coerção militar ou econômica (hard power).

O fenômeno do sportswashing pode ser observado em ações recentes, como a ida de grandes estrelas do futebol, com a ida de grandes craques mundiais, como Cristiano Ronaldo, Neymar Jr., e Karin Benzema, ao futebol árabe, além de iniciativas que envolvem a aquisição de grandes clubes, como o Newcastle United F.C., da Premier League inglesa, pelo Fundo Soberano da Arábia Saudita.

Para Simon Chadwick, professor de Geopolítica da Skema Business School, o termo sportswashing é insuficiente para capturar toda a complexidade do fenômeno. Em uma de suas análises, Chadwick questiona: “A Grã-Bretanha aprovou uma lei esta semana. Vamos começar a deportar imigrantes para Ruanda, mesmo que não sejam ruandeses. Eles poderiam ser da Síria ou do Vietnã, mas vamos enviá-los contra sua vontade. Mas, ao invés de falar sobre isso, estamos discutindo a Premier League e os jogos do fim de semana. Isso é sportswashing? Se você estivesse em Riad, Pequim ou em partes da África, diria: 'Isso parece sportswashing para mim’.”

Professor Simon Chadwick falando sobre o conceito de Sportswashing

Ao longo deste site, será analisado esse uso do esporte como ferramenta de distração e reconstrução de imagem, como durante os Jogos Olímpicos de 1936, o regime nazista de Adolf Hitler usou o evento como plataforma para promover a ideologia nazista ao mundo. Já na Copa do Mundo de 1970, realizada no México, o governo militar brasileiro aproveitou a vitória para ganhar apoio popular, em um momento em que a ditadura enfrentava sérias críticas internas. A Copa do Mundo de 1978, na Argentina, foi igualmente usada pela ditadura militar local para projetar uma imagem de estabilidade ao mundo; e o caso mais recente, que vem do futebol árabe, sediando copas, buscando grandes craques no mercado da bola, e até comprando grandes clubes, como o Newcastle United F.C., da Premier League (Inglaterra).

Este tema pode continuar pertinente por muitos anos, até porque um dos principais países que faz o uso deste fenômeno, sediará a Copa do Mundo de 2034, a Arábia Saudita, que já prometeu, no dossiê da Fifa, entregar oito estádios de última geração, com o maior deles capaz de acomodar mais de 92 mil pessoas.